Em 177 anos, publicação de contos e romances negros não chegou a 150 obras individuais no Brasil
Os debates sobre racismo, feminismo e protagonismo negro nos últimos anos resultaram em maior visibilidade da literatura afro-brasileira de forma geral e da literatura escrita por mulheres negras. A publicação de títulos de autoras e autores negros, entretanto, não avançou no mesmo ritmo dos debates e das legislações antirracistas.
A divulgação da escrita negra, afrodiaspórica, feita por mulheres, é o tema do Chá com Livros deste sábado, 21de novembro/2020, com participação da pesquisadora, mediadora de leitura, atriz e ativista social Ludmilla Lis. Levar a literatura negra para diferentes lugares, por meio da mediação, de performances e de leituras poéticas faz parte do dia-a-dia da pesquisadora, produtora cultural e ativista social. Mestranda em relações étnico-raciais, graduada em Letras e principal assessora da escritora Conceição Evaristo, Ludmilla Lis falará sobre a importância de ocupar espaços com as narrativas pretas.
Essa preocupação esconde números inéditos e alarmantes sobre a produção editorial com foco na escrita afro-brasileira. Uma pesquisa recém concluída, a ser publicada em 2021, mostra quase 2 séculos de invisibilidade do pensamento literário negro no Brasil.
No estudo “Panorama Editorial da Literatura Afro-brasileira através dos gêneros romance e contos”, os pesquisadores Luiz Henrique Silva de Oliveira e Fabiane Cristine Rodrigues, do CEFET-MG, analisaram os registros de diferentes fontes, bancos de dados e do mercado editorial para um primeiro levantamento sobre as publicações de obras individuais de romancistas e contistas negros de 1839 a 2016, gêneros menos editados dentro dessa vertente literária.
Sobre os contos escritos por autores negros, a pesquisa mostra que, de 1839 a 2016, foram publicados no Brasil 88 obras individuais de contos, por 55 editoras.
No gênero romance, de 1859, data de publicação da obra Úrsula, de Maria Firmina dos Reis, até 2016, foram publicados no Brasil por 56 editoras apenas 61 livros de romancistas negros.
Doutor em Teoria da Literatura e Literatura Comparada pela UFMG, Professor do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens e da Graduação em Letras – Tecnologias de Edição do CEFET-MG e Coordenador do Grupo de Estudos Produção Editorial Luso Afro Brasileira (PELAB), o professor Luiz Henrique Silva de Oliveira considera importantes os debates online, neste momento, sobre livros de autores afrodescendentes e sobre as formas de levar as narrativas pretas para diferentes públicos. Em sua pesquisa, o professor Luiz Henrique Oliveira afirma que “pensar a literatura afro-brasileira é pensar, antes de tudo, como se deu a inserção do negro, enquanto indivíduo e sujeito, nos percursos constituintes da sociedade brasileira”.
Ele considera que “desvendar as configurações editoriais de uma literatura na qual o negro enuncie sua vivência a partir de dentro é, acima de tudo, um ato ‘quilombola’ de resistência”.
Fabiane Cristine Rodrigues, Mestre em Estudos de Linguagens pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais- CEFET/MG e membro do Grupo de Estudos Produção Editorial Luso Afro Brasileira (PELAB), ressalta que os baixos números catalogados no Panorama Editorial da Literatura Afro-brasileira “são estarrecedores se compararmos com os números de obras gerais publicadas no mercado editorial brasileiro no período de um ano”. Para Fabiane, “um sintoma de como o racismo estrutural se manifesta dentro da literatura e das artes”.
Acompanhe Chá com Livros neste sábado, 21/11/2020, às 17h. Apresentação da jornalista Ana David - Entrevista com Ludmilla Lis: reflexões sobre autoras e autores negros no Brasil, a resistência do mercado editorial e as barreiras para estudos das narrativas afrodescendentes.